Certos entrevistados você descobre cedo que não são superficiais. E que não toleram uma abordagem superficial. A artista norte-americana Kara Walker, de 33 anos, muito cedo deixa claro que pertence a essa categoria. Suspira, comprime os lábios e arqueia as sobrancelhas, num gesto de impaciência, quando ouve a pergunta banal. "Sua arte teria então alguma coisa de terapêutica?" À questão standard do repórter do Estado, ela responde, enfim, com uma gostosa gargalhada, sentada numa mesinha de fundo do restaurante de um flat nos Jardins, concedendo o único depoimento que consentiu em dar durante sua estada em São Paulo "Acho que você pode dizer que eu comecei a trabalhar com isso com um intuito um pouco catártico, por uma série de razões", ela diz, com voz pausada. Ela acha que a sua "parte Califórnia" tem um entendimento universal, mas a "parte Geórgia" teve um impacto muito profundo na sua forma de ver o mundo. "Eu era muito naïf, ingênua sobre as estruturas sociais e as imagens introjetadas na mente das pessoas." Em geral, conta Kara, foi muito difícil para ela poder posicionar-se como artista, impor-se unicamente por seu modo de expor uma visão do mundo. "Oh, ela é uma mulher negra e ela fez uma pintura", dramatiza, com sarcasmo, comentando a reação comum das pessoas. "Então a minha pintura era vista como algo secundário." Subverter essa pré-condição era seu primeiro grande desafio. "Quando eu comecei a fazer o meu trabalho, eu tive de fazê-lo completamente negro", afirma. O cabelo cortado muito curto, a figura física forte, uma mulher de extrema beleza e olhar incisivo, Kara Walker é uma das presenças marcantes da 25.ª Bienal Internacional de São Paulo, com a exposição Slavery! Slavery!. É a representante oficial dos Estados Unidos na mostra.Nesse ano, Walker fez uma enorme escultura de açúcar, “Marvelous Sugar Baby” dentro de uma antiga fábrica. A escultura é de um comentário sobre os anos em que negros foram escravizados e forçados a trabalhar em campos de cana de açúcar e dentro dessa fábrica, onde essa escultura foi montada, em um passado recente.
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